Reportagens do jornal O Globo e do Viomundo sobre militante presa em protesto no Rio de Janeiro e o marido, agente da ABIN, que acusa a arbitrariedade da polícia e a versão do jornal.
Agente da Abin e mulher são presos participando de quebra-quebra no Leblon
Presos pela Polícia Militar sem documentos na madrugada de 18 de julho no Leblon, palco de uma das mais violentas manifestações do Rio, perto da residência do governador Sérgio Cabral, o casal de geógrafos Igor Pouchain Matela e Carla Hirt foram levados à 14ª DP, no bairro. Carla foi detida no momento em que supostamente atirava pedras na vidraça de uma loja, e Igor, por ter desacatado os PMs que a prenderam. O caso seria mais um dos que marcam os bastidores dos protestos na cidade, não fosse por um detalhe: segundo os policiais de plantão naquele dia, os dois se apresentaram como agentes da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) e agora são tratados como suspeitos de estarem ali trabalhando infiltrados. A Comissão Especial de Investigação de Atos de Vandalismo (CEIV) e a Polícia Civil estão investigando o caso.
A Polícia Civil confirmou ao GLOBO que Igor e Carla se apresentaram como agentes da Abin ao chegarem à delegacia. Também informou que, de acordo com o relato do delegado titular da 14ª DP, Rodolfo Waldeck, Carla foi presa em flagrante por formação de quadrilha, e Igor, por desacato a um PM. Na delegacia, Igor também teria desacatado a delegada Flávia Monteiro, responsável pelo plantão no dia. Carla foi autuada por formação de quadrilha e liberada após pagamento de fiança. Igor, por crime de desacato. Os dois não foram localizados para comentar a denúncia.
Segundo nota da Polícia Civil, a CEIV - criada depois dos atos de vandalismo durante os protestos - vai "investigar a informação de que o casal preso na manifestação do dia 18 de julho no Leblon seria integrante da Abin".
Agência nega ter agentes infiltrados
A Abin negou manter agentes infiltrados nas manifestações do Rio. Em nota, garantiu "desconhecer a prisão ou a autuação de servidor de seu quadro em 18 de julho ou nos dias subsequentes na cidade do Rio" e explicou que "o sigilo dos nomes dos integrantes da Abin é garantido pela lei 9.883, de dezembro de 1999, sendo, portanto, vedada a sua publicação, inclusive em atos oficiais". No Diário Oficial da União, de 2008, Igor aparece entre os nomeados para atuar junto ao Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República, ao qual a Abin está subordinada.
O caso de Igor e Carla acontece num momento delicado, em que vem à tona a participação de policiais fluminenses infiltrados em manifestações. Esta semana, o Ministério Público estadual anunciou que passou a investigar vídeos divulgados nas redes sociais, em que policiais do serviço reservado (P-2) da PM do Rio aparecem supostamente infiltrados no protesto em Laranjeiras, na noite de segunda-feira, durante a recepção ao Papa Francisco. No mesmo dia, a PM reconheceu o uso do expediente, informando que os policiais agem filmando, coletando provas e fazendo prisões.
Infiltrar agentes é prática reconhecida internacionalmente nos meios policiais de inteligência, mas os especialistas alertam que há limites: o agente infiltrado deve se limitar a observar, coletar informações e transmiti-las. Mas eles não podem se envolver em crimes - há denúncias de manifestantes de que PMs estariam incitando e até praticando atos violentos.
- Na ausência de disciplina legal específica, os limites da ação de inteligência são os parâmetros gerais, constitucionais e legais dos agentes estatais - disse um especialista, que preferiu o anonimato.
Ainda segundo ele, essa premissa tem sua validade confirmada na Lei n. 9.034/95, que trata dos meios operacionais para a prevenção e repressão de ações praticadas por organizações criminosas. Em seu art. 2, inciso V, a lei prevê a infiltração por agentes de polícia ou de inteligência, em tarefas de investigação, constituídas pelos órgãos especializados pertinentes, mediante circunstanciada autorização judicial.
- Falando em tese eu diria: mesmo para a infiltração estrutural, é preciso autorização judicial que preveja os limites genéricos da operação. Na lei atual, embora não esteja prevista a possibilidade da prática de crimes pelos agentes infiltrados, entende-se na doutrina ser admissível quando se tratar de prática necessária e imprescindível para a garantia da infiltração, o que envolve obter a confiança do grupo, e o crime a praticar for menor do que o investigado.
Carla Hirt: Baleada, agredida e acusada de formar quadrilha, militante diz que foi difamada pela mídia e teme represálias
publicado em 26 de julho de 2013 às 23:29
por Luiz Carlos Azenha, do Viomundo
Desde a noite do dia 17 de julho a geógrafa Carla Hirt, integrante do Comitê Popular Copa e Olimpíadas do Rio de Janeiro, vem vivendo um pesadelo.
Primeiro, foi atingida por dois tiros de balas de borracha durante manifestação na Zona Sul do Rio de Janeiro.
Depois, foi presa sob acusação de formação de quadrilha, apesar de desconhecer totalmente aqueles que foram presos junto com ela — supostamente integrantes da mesma quadrilha.
Em seguida, Carla foi autuada como se tivesse sido presa na rua Visconde de Pirajá, onde de fato aconteceram atos de vandalismo — quando, assegura, foi presa na rua Redentor, 294, diante de um prédio intacto, de fachada de vidro, onde ela e outros manifestantes se abrigaram justamente para evitar os tiros da polícia.
Finalmente, no dia 25, o jornal O Globo publicou uma reportagem ilustrada por uma foto que sugere que Carla e o marido dela, Igor, agente da ABIN – Agência Brasileira de Inteligência — teriam sido flagrados em atos de vandalismo.
Leiam a legenda.
Nem Carla, nem o marido aparecem na foto acima.
Ela não foi presa atirando pedras.
O marido nunca foi preso, nem nas ruas, nem na delegacia.
Igor foi à delegacia para socorrer Carla, que havia telefonado para relatar que tinha sido ferida por uma bala de borracha e estava a caminho da delegacia, presa.
O Globo fez mais: sugeriu no título que Carla e o marido foram presos “participando de quebra-quebra”.
A notícia de O Globo foi replicada nas redes sociais e por outros meios.
O jornal voltou ao assunto em outro texto, no qual destacou que a ABIN faria uma investigação do caso.
Porém, a própria nota oficial da ABIN desmentia o jornal.
Primeiro, deixou claro que Carla não pertence aos quadros da agência.
Depois, informou que o marido dela não estava infiltrado na manifestação.
Finalmente, que Igor passava férias no Rio de Janeiro.
Na edição impressa, o diário direitista anunciou: “Vândalo chapa-branca: Agente da Abin foi preso em protesto“. E fez trocadilho: "Faltou inteligência".
Igor Matela, o marido de Carla, escreveu um texto rebatendo o jornal.
Enviou por e-mail a O Globo:
“Hoje fui surpreendido por uma reportagem da editoria Rio do jornal O Globo que relata que eu e minha esposa, Carla Hirt, teríamos sido presos por ações de vandalismo no dia 17/07 na sequencia do protesto em frente à casa do governador Sérgio Cabral. Além disso, a reportagem afirma que eu e minha esposa teríamos nos identificado como agentes da Abin, insinuando que estávamos infiltrados e com outras intenções que não a livre manifestação política.
Gostaria de informar que tal reportagem é difamatória, não nos ouviu e publicou informações erradas que poderiam ser facilmente checadas na própria 14 DP. Carla é professora e atualmente doutoranda no IPPUR/UFRJ. Foi presa de forma arbitrária, agredida, baleada, acusada de formação de quadrilha junto com outros rapazes que ela sequer conhece. A denúncia é tão absurda que o Ministério Público indicou que não irá levar adiante, uma vez que a polícia não conseguiu provas do crime.
No meu caso, é verdade que trabalho na Abin. Passei num concurso público e sou um servidor federal como qualquer outro, submetido à lei 8.112. Tenho garantido minha livre manifestação política. Neste dia, não fui preso. Quando Carla estava sendo abordada e já tinha sido ferida, conseguiu me ligar.
Ouvi pelo telefone que estava sendo agredida e levada para a delegacia. Corri para a DP e cheguei lá uns 30 minutos depois indignado, perguntando pela minha esposa e questionando o abuso de autoridade da PM. Injustamente fui acusado por desacato, numa situação que nada teve a ver com atos de vandalismo. Me identifiquei com minha carteira de motorista e disse, quando a delegada que questionou, que trabalhava na Abin. Em nenhum momento tentei usar isso para o que quer que seja, pois se fosse assim teria sido autuado por abuso de autoridade ou então teria sido liberado.
Tudo isso está nos registros de ocorrência da delegacia.
Esta história conspiratória está me causando muitos prejuízos. Está ferindo minha honra e de minha esposa, me colocando em risco por me associar com policiais infiltrados e está me trazendo problemas no trabalho, onde posso sofrer um processo disciplinar.
Se quiserem ter referências sobre mim e sobre a Carla, sobre nosso efetivo e honesto engajamento político, podem perguntar a várias pessoas: professores do IPPUR/UFRJ (onde eu também curso mestrado), com o vereador Eliomar Coelho que conhece bem a Carla, Comitê Popular da Copa e Olimpíadas, Justiça Global, etc.
Gostaria de pedir que esta reportagem fosse retirada do site do jornal, pois nossos nomes completos estão sendo expostos, causando um prejuízo incomensurável para nós. Já estamos desmentindo a reportagem nas redes sociais, recebendo muita solidariedade de todos. Mas gostaria que os senhores também fizessem uma retratação.
Ciente de sua compreensão,
Atenciosamente,
Igor P. Matela“.
Carla Hirt: Baleada, agredida e acusada de formar quadrilha, militante diz que foi difamada pela mídia e teme represálias
publicado em 26 de julho de 2013 às 23:29
por Luiz Carlos Azenha, do Viomundo
Desde a noite do dia 17 de julho a geógrafa Carla Hirt, integrante do Comitê Popular Copa e Olimpíadas do Rio de Janeiro, vem vivendo um pesadelo.
Primeiro, foi atingida por dois tiros de balas de borracha durante manifestação na Zona Sul do Rio de Janeiro.
Depois, foi presa sob acusação de formação de quadrilha, apesar de desconhecer totalmente aqueles que foram presos junto com ela — supostamente integrantes da mesma quadrilha.
Em seguida, Carla foi autuada como se tivesse sido presa na rua Visconde de Pirajá, onde de fato aconteceram atos de vandalismo — quando, assegura, foi presa na rua Redentor, 294, diante de um prédio intacto, de fachada de vidro, onde ela e outros manifestantes se abrigaram justamente para evitar os tiros da polícia.
Finalmente, no dia 25, o jornal O Globo publicou uma reportagem ilustrada por uma foto que sugere que Carla e o marido dela, Igor, agente da ABIN – Agência Brasileira de Inteligência — teriam sido flagrados em atos de vandalismo.
Leiam a legenda.
Nem Carla, nem o marido aparecem na foto acima.
Ela não foi presa atirando pedras.
O marido nunca foi preso, nem nas ruas, nem na delegacia.
Igor foi à delegacia para socorrer Carla, que havia telefonado para relatar que tinha sido ferida por uma bala de borracha e estava a caminho da delegacia, presa.
O Globo fez mais: sugeriu no título que Carla e o marido foram presos “participando de quebra-quebra”.
A notícia de O Globo foi replicada nas redes sociais e por outros meios.
O jornal voltou ao assunto em outro texto, no qual destacou que a ABIN faria uma investigação do caso.
Porém, a própria nota oficial da ABIN desmentia o jornal.
Primeiro, deixou claro que Carla não pertence aos quadros da agência.
Depois, informou que o marido dela não estava infiltrado na manifestação.
Finalmente, que Igor passava férias no Rio de Janeiro.
Na edição impressa, o diário direitista anunciou: “Vândalo chapa-branca: Agente da Abin foi preso em protesto“. E fez trocadilho: "Faltou inteligência".
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Igor Matela, o marido de Carla, escreveu um texto rebatendo o jornal.
Enviou por e-mail a O Globo:
“Hoje fui surpreendido por uma reportagem da editoria Rio do jornal O Globo que relata que eu e minha esposa, Carla Hirt, teríamos sido presos por ações de vandalismo no dia 17/07 na sequencia do protesto em frente à casa do governador Sérgio Cabral. Além disso, a reportagem afirma que eu e minha esposa teríamos nos identificado como agentes da Abin, insinuando que estávamos infiltrados e com outras intenções que não a livre manifestação política.
Gostaria de informar que tal reportagem é difamatória, não nos ouviu e publicou informações erradas que poderiam ser facilmente checadas na própria 14 DP. Carla é professora e atualmente doutoranda no IPPUR/UFRJ. Foi presa de forma arbitrária, agredida, baleada, acusada de formação de quadrilha junto com outros rapazes que ela sequer conhece. A denúncia é tão absurda que o Ministério Público indicou que não irá levar adiante, uma vez que a polícia não conseguiu provas do crime.
No meu caso, é verdade que trabalho na Abin. Passei num concurso público e sou um servidor federal como qualquer outro, submetido à lei 8.112. Tenho garantido minha livre manifestação política. Neste dia, não fui preso. Quando Carla estava sendo abordada e já tinha sido ferida, conseguiu me ligar.
Ouvi pelo telefone que estava sendo agredida e levada para a delegacia. Corri para a DP e cheguei lá uns 30 minutos depois indignado, perguntando pela minha esposa e questionando o abuso de autoridade da PM. Injustamente fui acusado por desacato, numa situação que nada teve a ver com atos de vandalismo. Me identifiquei com minha carteira de motorista e disse, quando a delegada que questionou, que trabalhava na Abin. Em nenhum momento tentei usar isso para o que quer que seja, pois se fosse assim teria sido autuado por abuso de autoridade ou então teria sido liberado.
Tudo isso está nos registros de ocorrência da delegacia.
Esta história conspiratória está me causando muitos prejuízos. Está ferindo minha honra e de minha esposa, me colocando em risco por me associar com policiais infiltrados e está me trazendo problemas no trabalho, onde posso sofrer um processo disciplinar.
Se quiserem ter referências sobre mim e sobre a Carla, sobre nosso efetivo e honesto engajamento político, podem perguntar a várias pessoas: professores do IPPUR/UFRJ (onde eu também curso mestrado), com o vereador Eliomar Coelho que conhece bem a Carla, Comitê Popular da Copa e Olimpíadas, Justiça Global, etc.
Gostaria de pedir que esta reportagem fosse retirada do site do jornal, pois nossos nomes completos estão sendo expostos, causando um prejuízo incomensurável para nós. Já estamos desmentindo a reportagem nas redes sociais, recebendo muita solidariedade de todos. Mas gostaria que os senhores também fizessem uma retratação.
Ciente de sua compreensão,
Atenciosamente,
Igor P. Matela“.
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